domingo, 18 de março de 2007

Siena Root: a magia dos anos 70

Ainda dá! Este texto eu escrevo para os amantes cabeça-dura do rock setentão, aqueles que não conseguem satisfação plena com a produção musical atual. Para aqueles que defendem com convicção a idéia de que “a magia daquela década não se reproduz hoje”. Escrevo isso com prazer e alívio, pois posso dizer que conheci uma banda que satisfaz todos os pré-requisitos que compõem a bendita “magia” do rock dos anos 70. Guardem esse nome: Siena Root. Formada em 1997 em Estocolmo, Suécia, a banda era composta por Oskar Lundström (vocais, teclados), KG West (guitarra, vocais), Sam Riffer (baixo, vocais) e Love H. Forsberg (bateria). Ganharam moral no underground sueco, até conseguirem contrato para a gravação do álbum de estréia, A New Day Dawning, em 2004. Lá já estava a matriz do som da banda: blues, hard rock clássico de monstros como Led Zeppelin, Black Sabbath e Deep Purple, com riffs encorpados, cozinha repleta de groove, fartura de órgãos Hammond e longas e viajadas jams, abastecidas por boas doses de rock progressivo e psicodélico. Estréia mais que promissora! Apesar da promessa, em 2005 o grupo passa por uma reformulação. Sai o Oskar, dando a vaga para Sanya, detentora da mais poderosa voz feminina do rock atual, na minha opinião. Sua entrada deu mais charme e poder à banda, fazendo com que a semelhança do seu som com os clássicos 70’s se acentuasse de forma surpreendente. Os teclados são assumidos por KG West. No mesmo ano gravaram o batismo de fogo de Sanya à frente dos vocais, o maravilhoso EP de duas músicas intitulado Mountain Songs. A primeira faixa, Mountain Songs I, apresentava um groove rock banhado em teclados Hammond, uma percussão malandra e um colorido psicodélico nas experimentações. Em Mountain Songs II o que se apresenta é um blues rock mais suave e viajante, com uma aula de interpretação de Sanya. O EP com a nova formação chamou a atenção de fãs e da crítica especializada, o que gerou grande expectativa para o primeiro full lenght com Sanya. Em 2006 vem o golpe de misericórdia. É lançado Kaleidoscope, oito faixas de puro deleite musical, um álbum daqueles que a gente gosta de bater no peito e dizer “é perfeito da primeira à última música”. Tudo que a presença de Sanya representou como promessa foi cumprido. As jams ficaram mais ousadas, as linhas de guitarra e teclado atingiram um nível de excelência surpreendente, o vocal de Sanya definitivamente cresceu e assumiu sua importância, a cozinha tornou-se mais relevante no som da banda, tudo ficou mais redondo. A influência da música indiana, com cítaras e notas repetidas e hipnóticas, se faz presente na épica Bhairavi Duhn. A perfeição do álbum se traduz claramente em Nightstalker, a segunda faixa. Difícil descrevê-la. Posso dizer que a “magia” está lá. Dá para imaginar essa faixa estourada nas rádios rock em 1972, por exemplo. Na minha humilde opinião, a melhor música de 2006. E, até gora, não ouvi nada neste ano que a tire do trono. Não espere do Siena Root nenhuma revolução na música. Essa não é, nem de longe, a intenção deles. Parece que eles nunca ouviram falar em gravação digital ou sonoridade hi-fi. Em contrapartida, eles representam um farto banquete em timbres quentes, guitarras valvuladas, baterias e baixos graves, teclados viajantes, vocal poderoso e bluesy, enfim, música feita com a alma. Como disse aos amantes de rock 70 no início do texto, a esperança está viva. Ainda dá! Cristian Pundonor Nota: Siena Root, apesar de toda a sua qualidade, ainda é uma banda bastante obscura. Há pouco material à venda, e os preços são absurdos. Portanto, o bom e velho mp3 é inevitável. Saiba mais sobre essa preciosidade em www.sienaroot.com ou www.stonerrock.com.

Saiba um pouco sobre Stoner Rock

Que diabos é o tal Stoner Rock? O ano era 1970. Na contra-mão da cultura “paz e amor” da geração flower power, surge uma banda falando sobre bruxas, demônios, drogas, e toda uma sorte de sentimentos humanos não muito bonitos. Com afinações baixíssimas, notas de guitarra dissonantes em acordes menores e variações de andamentos nas músicas, alternando entre o vigor galopante do bom e velho rock n’ roll e ritmos muito lentos (ninguém fazia isso na época), emerge das profundezas o monolito conhecido como Black Sabbath. Marco zero do Heavy Metal. Ponto final. Todo o resto já foi dito. As sementes do chamado Stoner Rock foram lançada à terra. Mas elas não germinaram sozinhas. Também compõe a gênese do estilo em questão o poderoso hard rock produzido nos 70’s, representado pelos pesos-pesados Deep Purple, Uriah Heep, Grand Funk Railroad, entre outros. Acontece que, no início dos anos 90, uma molecada americana completamente aloprada resolve dar uma atualizada na receita dos dinossauros setentões. Plugando guitarras em amplificadores de baixo, fazendo jams extensas e viajantes e criando grooves pesados e musculosos, surge o monstro chamado Kyuss. Seu segundo disco, o aclamado Blues from the Red Sun (1992), ditou a fórmula do insipiente Stoner Rock: peso viajante, chapação, instrumentações longas, riffs à la Tony Iommi (Black Sabbath), alternâncias de andamentos e, principalmente, muita honestidade e nenhuma preocupação com as paradas de sucessos. Josh Homme (guitarras) era o capitão desse time, e tinha apenas 16 anos na época. Pois bem, Black Sabbath, marco zero. Kyuss, marco um. Outra banda fundamental para a consolidação do estilo nos EUA é o Corrosion of Conformity (ou C.O.C.). Formada em meados dos 80’s, a banda começou fazendo um hardcore tradicional, mas a partir de 1992 reinventou-se com o clássico Deliverance (ouça Albatross). Junto ao Kyuss, o C.O.C. disseminou a fórmula stoner, ocasionando o aparecimento de inúmeras bandas underground que engrossaram o caldo do movimento. O nome stoner é um trocadilho com a palavra stoned (“chapado”). A mistura de peso e distorção com instrumentações longas e viajadas atingiu em cheio os apreciadores do rock pesado dos 70’s e das viagens alucinógenas do psicodelismo dos 60’s. Novamente os espectros dessas duas décadas mágicas da música se fizeram presentes, mas agora aliados a um peso mais denso e encorpado, herança do Heavy Metal propriamente dito e da sujeira sonora do fenômeno grunge (era Sub Pop, gravadora antológica do movimento). Mas não se deixe enganar, a intenção do Stoner Rock é, em sua grande maioria, exalar o astral 60 e 70, através de sonoridade low-fi, instrumentos vintage e muita experimentação cerebral. São várias as vertentes percebidas neste movimento. Mesmo tendo o Black Sabbath como espinha dorsal (isso é inegável), muitas bandas centram-se em andamentos mais retos e acelerados, herdados de bandas como Blue Cheer e Motorhead (exemplos: Fu Manchu, Dozer, Daredevil, entre outros). Outras esforçam-se (e conseguem) em enganar o ouvinte, fazendo-o jurar que está ouvindo uma gravação dos anos 70. Nestes se incluem algumas das minhas bandas prediletas, como o Black Bonzo e o italiano Wicked Minds (é possível soar como o Uriah Heep hoje em dia!) e o desbundante Siena Root (no disco de 2006, Kaleidoscope, se encontra a melhor música do ano passado, na minha opinião. Ouça Nighstalker e depois me diga!. Timbres de gravação incrivelmente setentista e vocal feminino poderoso e marcante. Os grupos Burning Saviours e Witchcraft seguem a mesma linha de sonoridade vintage, não dando nenhuma pista de que suas gravações foram feitas nesta década. Bandas stoner existem hoje em todo o mundo, inclusive no Brasil (vide Sonic Volt, Flaming Moe, Yellow Plane, entre outras). Mas, convenhamos, ninguém bate a produção sueca, pois é intrínseco nas bandas desse país o groove, o peso, a melodia, a timbragem dos instrumentos e a veia setentista de se fazer rock. Não é à toa que alguns dos patronos do movimento são de lá. Vem dessas terras o colosso chamado Spiritual Beggars. Liderada pelo guitarrista Mike Amott (ex-Carcass), essa banda vem desde meados dos anos 90 explodindo as mentes de apreciadores de rock pesado. Em tempos de música descartável e ídolos efêmeros, esses caras me fazem suar frio cada vez que abro a embalagem de um cd ou que conheço alguma novidade deles. E eu agradeço imensamente por isso! Mas não é por menos, os Beggars têm tudo: peso e melodias grandiosas na medida exata, uma cozinha matadora, criadora de grooves poderosos, o bom e velho astral setentista, um esmero com a sonoridade dos instrumentos, e o melhor vocal masculino do mundo do peso atualmente, na minha opinião. Seu nome: JB, uma garganta de aço descomunal ou, como costumo chamá-lo, o “David Coverdale do Inferno”. Pra completar, esse viking ensandecido ainda é vocal, guitarra e líder do Grand Magus, outra besta-fera sueca, que prima por andamentos mais lentos e pesados, com muita influência do Doom Metal, mas com muita melodia e climas apoteóticos e grandiosos, elementos caracteristicamente suecos. Os EUA também têm sua respeitável produção stoner. Uma vertente tipicamente americana é a que mescla os elementos do stoner rock com o southern rock de bandas como The Allman Brothers e Lynnyrd Skynnyrd. Seus principais representantes são o Alabama Thunderpussy (maravilha de banda, muito peso mesclado com o típico groove do rock sulista americano), a garotada do Black Stone Cherry (com uma pegada mais metal, misturando riffs certeiros e uma cozinha azeitada), o Beaten Back to Pure (groove, peso e vocais guturais) e o Down, mega-banda formada por Phil Anselmo (ex-Pantera, Super Joint Ritual) nos vocais, Pepper Kennan na guitarra, oriundo do já citado Corrosion of Conformity. Completam o time músicos de bandas como Crowbar e Eyehategod, outras usinas de produzir peso e distorção. Isso é apenas uma pincelada nesse universo vasto e rico, onde a cada dia surgem mais bandas, cada uma incorporando elementos mais inovadores ou simplesmente reproduzindo fielmente a mágica das décadas anteriores. Um excelente site para pesquisas e descobertas a respeito é www.stonerrock.com, que contém links para os sites oficiais das bandas. Outra pedida é o www.hellridemusic.com, que contém entrevistas e lançamentos, e serve para se manter bem atualizado. Mas, como a cena stoner é predominantemente underground (pelo menos por aqui), o acesso à música das bandas é difícil, e o custo dos cds importados é muito elevado. Raramente uma banda é lançada pelas nossas gravadoras. A saída, então, é o inevitável mp3. Então termino esse texto dando umas dicas de algumas bandas que considero vitais para minha satisfação musical atualmente. Se por acaso se deparar com alguma delas, dê um jeito de conhecer de alguma forma. Depois, me conta como foi a experiência sonora... e mental. Abraço. Cristian Pundonor Lista “Cotonete de Veludo” Stoner: - Spiritual Beggars (Suécia) - Grand Magus (Suécia) - Siena Root (Suécia) - Abramis Brama (Suécia) - Big Elf (EUA) - Alabama Thunderpussy (EUA) - Sir Hedgehog (Canadá) - The Quill (Suécia) - Firebird (Inglaterra) … e por aí vai...